sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Um grande desafio!

Tudo começou em um dia que sai de casa em busca de uma história. Máquina fotográfica, gravador, bloco de anotações e caneta. Fui às ruas, com olhar atento, procurando personagens. Andei, andei e andei. Estava no final da Duque de Caixas, desistindo da empreitada, quando passei pela Garagem dos Livros.

O local fica em frente ao Gasômetro e ganhou visibilidade em setembro , pois abriga a obra da artista Élida Tessler pela 8º Bienal do MERCOSUL.  Foi matéria na Zero Hora, nada de novo. Mas algo fez com que eu entrasse. Talvez o fato curioso de uma sapataria funcionar dentro do lugar ou, simplesmente, por ser um sebo e eu nutrir certo fetiche por livros.

Fiquei encantada com o acervo. Se não bastasse a garagem, o corredor da casa tinha estantes cheinhas das mais variadas obras. Enquanto eu  as olhava, João – o dono do sebo - aproximou-se e logo foi se apresentando. Ali, percebi que a minha saída em busca de uma história não tinha sido em vão.

Depois das primeiras palavras trocadas, tive a certeza que queria saber mais quem era João Machado, de 71 anos. Saber sobre a sua relação com os livros, sobre a sua vida e o que estava por trás daquele lugar. Não me interessava a bienal, assunto batido das matérias veiculadas sobre o sebo. Eu sabia que - obviamente -, a partir dos critérios de noticiabilidade aprendidos na sala de aula, o evento era o gancho jornalístico para se fazer a matéria. Pouco me importei, até porque eu não estava lá com nenhum compromisso de fazer uma reportagem. Eu só queria conhecer aquele senhor que despertou a minha curiosidade.

Apresentei-me como jornalista.  Sem nada programado, sentamos e ficamos conversando por quase quatro horas. Entre um gole de café e outro, João discorria sobre sua vida. A cada fala, uma surpresa diferente e agradável. Eu aprendia sobre literatura e me deliciava ao perceber a sabedoria daquele homem ao relembrar as dificuldades de sua trajetória.  Tanta informação, tanta curiosidade, tanto detalhe especial. Despedi-me com a promessa de voltar para terminar nossa conversa, sabendo que havia conhecido alguém com muito para compartilhar.

Hoje, após quase duas semanas, voltei à Garagem dos Livros. Mais detalhes me encantaram. Conheci o João poeta e declamador. Lá se foram quase quatro horas novamente. Deslumbrei-me com a capacidade que tem de se comunicar.  A poesia dele é preciosa. Além disso, as palavras - quando não está declamando – também exalam beleza.

Agora, tenho um difícil desafio em mãos.  Após dois encontros – com intervalo de quase duas semanas entre eles – possuo, aproximadamente, oito horas de entrevista para transformar em texto.  Tenho a missão da edição.  É claro, que isso foi resultado da minha escolha.  Eu poderia ter limitado a conversa com entrevistado, poderia ter realizado perguntas objetivas que gerassem respostas sucintas. No entanto, preferi não determinar tempo para ir embora. Confesso que talvez tivesse sido melhor para meu trabalho ter programado perguntas e ter  dado uma linearidade maior. Entretanto, estou certa de que um pouco da graça e da riqueza  de nosso gostoso papo teria se perdido. 


Uma dúvida é se, realmente, essa história irá interessar a alguém. Sem muitas pretensões, decidi, a despeito disso, escrevê-la, pois ela me fez lembrar o motivo de ter escolhido ser jornalista.  Começo sabendo que a edição será ingrata, pois cada fala teve um significado especial.  Creio, porém, que a maior dificuldade será me despir de toda a linguagem jornalística supostamente objetiva e tentar traduzir, através de palavras,  a poesia que permeou as falas e os gestos desse personagem encantador.

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